
Um turbilhão de pensamentos vem de uma vez. É tão brusco que até o ritmo da minha respiração muda. Cinco e pouco da manhã, num avião em turbulência, eu voo de volta para casa com a cabeça cheia de respostas, perguntas e constatações.
Eu sempre quis ser a melhor em tudo, nunca me esforcei para sê-lo. Vivo uma eterna dualidade. Sei que toda essa gana para ser a melhor é completamente irreal, mas continuo encarando todos meus feitos e erros como fracassos irreparáveis. Reconheço a impossibilidade do desejo que me guia, mas isso não é suficiente para evitar a dor da não realização.
É uma busca paralisante. Me travo no querer tanto, não avanço, não prossigo, me estagno. Parada em lugar nenhum, sinto a dor de não realizar e de não desistir. Repito essa fórmula furada desde sempre. Um dia foi por ignorância, agora é por covardia.
Quero me levantar, mexer meus pés, dobrar meus joelhos. Sinto minha pele da perna arder, queimar, doer. Como uma sugestão, meus neurônios trabalham para me lembrar que trombose é comum em viagens de avião. Sacanas!
Mesmo com uma leve turbulência, solto o cinto, me levanto e dobro minhas pernas algumas vezes. Enquanto sofro com essa dor misteriosa que me assombra desde setembro passado e a ansiedade que a segue, continuo tentando achar o fio da meada.
Entre o sono, a dor e o desespero, percebo que eu preciso tentar, tentar de verdade, me tornar a melhor no que diabos eu cismar ser. Querer é enérgico, ágil e vivo, por isso me aprisiona. Tantas possibilidades, inclusive a de falhar, me deixam inerte mesmo num ambiente tão ativo. No fim, dissipo energia num movimento previsível, circular e sem ousadia. Erro querendo evitar o erro. Empenhar-se em conseguir também tem um certo dinamismo, menos arrojado, claro, mas preciso.
Disciplina, competência e eficiência. Ir, enfim, pra frente. Sei que será sinuoso, apesar de parecer retilíneo e uniforme. Chato, talvez, mas nenhuma busca pode ficar só no querer e o tentar tem dessas. Sem aprender a tentar, tentar de verdade, eu não vou compreender o que é falhar e nem vou conhecer os resultados que posso alcançar.
No meio do meu querer impossível, tem também o receio de não conseguir nem chegar perto e uma vontade enorme de que o mundo seja fácil.
Gosto da praticidade do avião, gosto de olhar para o chão e ver toda nossa realidade reduzida e perceber que ela é um recorte de um todo, mas voar me dá um certo medo. Medo que me cerca também em terra. Medo que evita dores e cria outras. Medo de morrer e de viver.
Mexo os pés, estico a perna, respiro fundo. Dói tanto quanto a certeza de que o fracasso ainda vai formigar, arder e queimar dentro de mim. Vejo o sol nascer entre as nuvens e o rosa, o laranja e o azul tomarem conta da janelinha do avião. Sinto a pressão nos meus ouvidos que agora também doem. O avião vai pousar e eu preciso escrever tudo isso antes que eu esqueça que eu sei bem o que eu tenho que fazer.
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