Decidi que fico

Desenho do artista Stephen Wiltshire

Me apeguei a esta terra. Cheguei aqui pensando que logo voltaria para minha cidade natal e abandonaria a vontade de conhecer um mundo além daquele que me circundou por anos, mas me enganei. Era um medo infundado de quem nunca saiu do casulo. Agora cá estou eu querendo fixar morada numa terra em que não se pisa descalço. Bem eu que passei a infância com o pé encardido de tanto andar na terra vermelha.

Quando cheguei e o medo inicial passou, eu pensei que iria querer conhecer o mundo todo e passar no máximo uns dois anos em cada lugar. Achei que eu tinha um espírito meio nômade, meio aventureiro de quem ficou tanto tempo num lugar só que nunca mais soube parar. Só que eu parei. Comecei a me encantar pela construção dos prédios, pelos grafites pichados nas paredes, pelos caminhos que fazia e pela praticidade de morar perto do supermercado, padaria, papelaria, lanchonete e bar. Tem até uma loja de aquários na minha nova rua! Dá pra acreditar nisso?

Cheguei aqui num ônibus que chamam de “cata Jeca”, zombaram um pouco do meu sotaque e das palavras que uso. Falaram até que era como se eu falasse como se vivesse em outro século, fraga? Tento me adaptar, adiciono umas gírias que conheci aqui no final das frases, faço isso pra mostrar que quero me enturmar. Tenho ido bem. Algumas coisas que falo passaram a fazer parte do vocabulário de quem convive comigo e eu gosto dessa troca. Cada diálogo aqui tem sido uma curta apresentação de um pouco dos nossos diferentes mundos. O urbano encontra o interior na sala 1001 do Edifício Lobo.

Quem mora aqui nota minha vontade de conhecer tudo e resolve ir onde nunca foi mesmo morando há vinte e cinco minutos de ônibus do lugar. Apresento para eles meus causos, meu sotaque, minhas palavras diferentes e até mesmo a curiosidade de explorar a cidade que eles vivem. Ao me acompanharem, eles voltam a perceber a própria cidade que estava esquecida por representar o cotidiano. Vejo isso acontecer e espero voltar para onde nasci no natal para ver o que eu não conseguia ver por estar perto demais.

Uma cidade já é um mundo grande demais para conhecer de uma vez. Uma das maiores cidades do país então… Decidi ficar, fiquei e agora fico de vez.


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Publicado por

Thaís Campolina

O que falta em tamanho sobra em atrevimento. Isso foi dito sobre um galinho garnisé numa revista Globo Rural dos anos 80, mas também serve pra mim.

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