Roger Waters nos convida a resistir

Acervo pessoal

Roger Waters nos ofereceu um verdadeiro espetáculo sensorial na noite desse último domingo (21/10). Sons, imagens, luzes e até mesmo uns graves que fazem nossas entranhas vibrarem junto. No meio de tanta gente, nem o olfato é poupado. Pipoca, cigarro — legal e ilegal — e algum perfume bem doce, tudo isso bem misturado, invadem as narinas, enquanto a música nos faz sentir vivos como nunca.

Ao tirar os olhos do palco, o espetáculo também continua. Da arquibancada vejo gente, muita gente. São 51 mil pessoas e seus rostos e corpos juntos criam uma cena que me faz pensar no Mineirão como um quadro impressionista: quando olhamos o todo, vemos o público nas arquibancadas e pistas cheias, mas só enxergamos pontinhos manchados se tentamos focar.

Essa multidão canta junto clássicos como Time, Wish you are Here e Another Brick in the Wall, mas nessa última há uma disputa de narrativa. Quando as crianças tiram o uniforme de presidiário e exibem camisas com a palavra Resist estampada, a maioria grita #EleNão e, em oposição, parte do público diz #EleSim, Fora PT e Mito.

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As reações ao intervalo e suas palavras em vermelho variam: palmas, vaias e gritos de empolgação. Todos esperam a vez do “Resist neo fascism” para gritar ainda mais. Quando esse letreiro surge, alguns vaiam uma frase que deveria ser uma unanimidade.

O momento é marcado por mensagens ativistas. Temas como estado laico, guerras e a situação da Palestina são lembrados. Roger nos encoraja a resistir à poluição, ao Facebook e, principalmente, ao neofascismo. Na imagem dos neofascistas atuais, aquela que virou assunto nos jornais do país, o nome Bolsonaro continua tampado por uma tarja vermelha com a frase “ponto de vista político censurado” escrita.

Essa tarja diz mais até mesmo que a frase que estampava essa arte no primeiro show do artista no Brasil durante essa turnê. Ela é uma amostra de como funciona um Estado autoritário. Ela é, acima de tudo, um aviso, principalmente para aqueles que caíram no canto do neofascista tupiniquim. É assim que vai ser, Roger nos diz, nos alerta.

Diante do recente escândalo mundial que envolveu Cambridge Analytica e o uso de dados pessoais para influenciar as eleições estadunidenses, a crítica ao Facebook e ao Mark Zuckerberg merece uma atenção especial, principalmente após a denúncia de que empresários pagaram, sem qualquer declaração para a Justiça Eleitoral, para que empresas produzissem e espalhassem pelo Whatsapp conteúdo, muitas vezes mentiroso, para beneficiar Bolsonaro como candidato frente ao Fernando Haddad. Com isso, o músico evidencia a nova roupagem das ameaças que já conhecemos.

De repente, a capa de Animals começa a surgir a partir de uma imagem de destruição bem na nossa frente e vem Dogs. Depois um balão com um porco começa a circular. Nele está inscrito “Seja humano” em português e em inglês. Está na hora de Pigs.

Roger coloca uma máscara de porco e levanta um cartaz que diz que os porcos dominam o mundo. Depois ele arranca a máscara do rosto e dessa vez levanta outro cartaz. Esse diz ‘Fuck the pigs”.

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O telão zomba de Trump, enquanto a música acontece. As críticas ao atual presidente dos EUA são várias. Até suas falas problemáticas são expostas. Depois do letreiro “Trump é um porco” tomar conta de tudo, ouvimos uma máquina registradora. É a hora de Money. Agora vemos a imagem de diversos líderes políticos se sobreporem numa tela que exibe joias, notas, carros. Bush é um deles.

Com Us and Them, aparecem imagens de rostos diversos, manifestações e policiais posicionados. Em um close, ganha destaque um cartaz que diz Black Lives Matters, Love is Love, Women Rights are Human Rights e questões sobre imigrantes e meio ambiente.

O show continua. Mais uma capa de álbum aparece. Agora temos uma pirâmide de luz diante de nós. Cantamos, sorrimos, nos emocionamos mais uma vez e, após Comfortably Numb, a última música, agradecemos a experiência com todo um estádio gritando “Ole ole ole ole Roger Roger”.

Usando um telão e tecnologias visuais, o ex-baixista da banda Pink Floyd, apresenta algo muito além da música e mais uma vez faz um show que explora imagem, som, sensação, performance e manifesta o que está bem evidente em suas letras: é preciso ser mais humano e resistir ao neofascismo.


Observação: Existem muitas fotos incríveis desse show e de outros dessa turnê, mas eu optei por usar imagens que tirei como fã, porque esse texto é, sobretudo, uma narração de uma experiência.


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Publicado por

Thaís Campolina

O que falta em tamanho sobra em atrevimento. Isso foi dito sobre um galinho garnisé numa revista Globo Rural dos anos 80, mas também serve pra mim.

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